Quem andar pelas ruas de São João del-Rei de olhos semicerrados - obscurecendo a visão para melhor observar a dinâmica social - terá a impressão que a cidade é de uma única cor. Que os são-joanenses são todos uma gente morena, feita de um barro só, exposto igualmente ao sol, pelo mesmo tempo, para queimar.De olhos abertos, a realidade é outra: negros e mulatos, em notória maioria, reforçam a cor da paisagem humana. Com alegria esfuziante ou recatada timidez, com nobreza e fidalguia das antigas cortes africanas ou com a humildade de quem, desde a escravidão, foi explorado e teve tudo subtraído. Com força mansa, atitudes delgadas e vozes sonoras mas com a emoção que remonta a crimes históricos.
Até para os são-joanenses, todos, às vezes parece que não há diferença. Que brancos, negros, mulatos e morenos somos todos iguais. Essa relativa igualdade é positiva, ainda mais que foi impulsionada pela força flexibilizadora da arte na qual, desde os tempos do ouro, negros e mulatos se destacaram como notáveis músicos, artistas, artífices e artesãos. Hoje, origem étnica, por si só, não é obstáculo para se galgar qualquer posto, o que abre ainda mais os horizontes para os descendentes daqueles que, até a metade do século passado, certamente muita dificuldade tiveram para ascender social e economicamente.
Mas a ascensão não pode ser o "canto da sereia", assim como o sonho da igualdade plena não deve levar à cegueira cultural, ao ressequimento das memórias ancestrais e ao aniquilamento da matriz teluricamentente africana, que são a fonte e a força da cultura negra, da qual provieram também os mulatos e os morenos.
Se os brancos, por sofisticado e perverso racismo, sutilmente, induzirem a isto, estão dilapidando uma face viva de toda a cultura universal. Se os negros, os mulatos e os morenos, por ingenuidade ou desmedida ambição, se submeterem a este genocídio cultural, sem dúvida estão regressando a um novo processo escravagista, subjugando-se à espoliação de um bem que pode não ser retornável nem renovável.
Nesta semana em que sexta-feira é 13 de maio, São João del-Rei, ouçamos Clementina de Jesus e pensemos nisto!
Excelente postagem, Emílio! Este é um chamado para as pessoas de São João (e das Gerais) olharem para sí próprias, lembrarem das origens e valorizar-se.Salve-salve!
ResponderExcluirAproveito para convidar a todos para visitarem o www.daquidepitangui.blogspot.com e conferir "as luas de Pitangui" nas lentes do meu amigo Nicodemos Rosa.
GraNDE abraço, Emílio.
É isso aí Leonardo.
ResponderExcluirPenso que os blogs também podem ter um papel social, fazer pensar, serem úteis na transformação da sociedade, provocar mudanças de atitude.
Ante a produsão de meios de comunicação tão pasteurizadores e alienantes, a serviço de um pensamento dominador e dominante, havemos de ter esperança e acreditar. Os blogs nos dão estes meios.
Será um prazer conhecer o trabalho de Nicodemos Rosa,nas Luas de Pitangui.
Grande abraço.