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Mostrando postagens de agosto, 2014

Ninguém duvida: em São João del-Rei os sinos falam! Quer entender o que eles dizem?

A intimidade de São João del-Rei com os sinos não é de hoje. Logo nos primeiros anos de surgimento do Arraial Novo de Nossa Senhora do Pilar do Rio das Mortes, o sino já andava falando entre os forasteiros que vieram a ser os primeiros são-joanenses. Bem, como ainda nenhuma igreja havia sido construída neste vale da Serra do Lenheiro, na verdade quem falava era uma sineta, hoje parte do acervo do Museu de Arte Sacra. Desde então, no peito dos são-joanenses bate um sino. Ao longo de três séculos desenvolveu-se uma linguagem sineira rica, complexa, bela e sofisticada, eficaz para transmitir informações em uma época em que não havia, no início do Ciclo do Ouro, nos arraiais em nascimento, nenhuma alternativa para a comunicação de massa. Assim, eram os sinos que cumpriam este papel. Informavam horas, datas e eventos religiosos, bem como as circunstâncias mais diversas, como dificuldade no parto, agonia, morte e sepultamentos. De lá para cá, muita água passou sob as pontes do Ro

Mágicos talismãs sonoros de São João del-Rei, a mais barroca cidade de Minas

Engana-se quem pensa que a única finalidade dos sinos de São João del-Rei, além de compor as torres das belas igrejas barrocas, é informar e anunciar, em linguagem setecentista, as horas, missas, novenas, quinquenas, trezenas, tríduos, ofícios, procissões, partos difíceis, agonias, mortes e sepultamentos. Ao darem vida e enriquecerem a tão singular sonoridade são-joanense, eles desempenham outra função, pouco conhecida na própria cidade. São talismãs sonoros que, ao dobrarem e repicarem, lançam céu afora, em forma de notas musicais, proteção contra tormentas e desejo de ventura, até os limites onde seu som, mesmo morrendo, alcança. Esta missão lhes é confiada no momento em que, antes de serem elevados pela primeira vez à torre, recebem a bênção do batismo e também o nome. A oração, rezada para o sino São João da Cruz, que este ano subiu para uma torre da igreja do Carmo, diz o seguinte:           " Que dos lugares onde ressoar este sino             se afaste para longe 

A sabedoria dos sinos e dos sineiros de São João del-Rei Salomão

Bons ventos sopram sobre São João del-Rei. Por mais que o amor são-joanense chore pelos pedaços da paisagem que se perdeu, clame com bravura pelo que corre risco e vigie, com apaixonado olhar, o tanto de memória que nosso tempo herdou dos séculos passados - e até exatamente como efeito destas três coisas - a cidade vê, a cada instante, seu passado reluzir. Não o passado que passou, levado pelo tempo, e que agora é só lembrança. Quem reluz é o passado que eternizado ficou e brota a cada geração na alma do povo deste lugar. Se nossa paisagem urbana mostra antigas e recentes cicatrizes inapagáveis que exibem  insensibilidades e ignorâncias, nossas tradições a cada dia se tornam mais fortes, mais ricas, mais singulares e envolventes. Basta assistir a uma das muitas procissões que acontecem o ano inteiro no centro histórico para dissipar qualquer dúvida sobre esta verdade. Muito ainda há por fazer e por certo muito ainda sempre haverá. Afinal, todos sabemos, o fazer cultural é um mo

Na Festa da Boa Morte, espelho do céu, São João del-Rei é a mais barroca cidade de Minas

Hoje, São João del-Rei parece o Céu em dia de festa. O amanhecer foi saudado com uma ruidosa alvorada festiva. Na metade da manhã, uma grandiosa e longa missa barroca revive solenes rituais de antigamente, plenos de música colonial e de narrativas fantásticas e apocalípticas, como a do dragão que derrubou as estrelas do céu. Quando o sol, sonolento, estiver caindo atrás da Serra do Lenheiro, uma procissão setecentista mostrará aos olhos brilhantes dos são-joanenses o caminho entre nuvens e estrelas que Nossa Senhora da Assunção, resplandecente e com o pé direito pousado sobre uma lua crescente de prata, fez até os Céus. Lá, transmutou-se em Nossa Senhora da Glória, ao ser coroada pelas três pessoas da Santíssima Trindade. Em São João del-Rei, este caminho passa por estreitas ruas coloniais, por praças, largos e becos, onde as nuvens são de incenso e de algodão doce e as estrelas são de flores e de fogos de artifício. Tudo ao som dos sinos da Matriz do Pilar e da Orquestra Lira Sa

Medos, segredos e mistérios do agosto na velha São João del-Rei

Antigamente, agosto era o mês mais temido pelo povo de São João del-Rei. Com seu céu pesado e opaco, com seu tempo brusco e suas ventanias, o oitavo mês do ano inspirava, aos são-joanenses do começo do século XX, quase tanto medo quanto a Quaresma. Isto porque acreditavam que nos 40 dias de jejum e sofrimento de Jesus, o Coisa-ruim, com permissão divina, estava solto na terra para tentar também os homens. E com suas ciladas, embustes, armadilhas, pactos e ilusões, desviá-los do bom caminho para por a perder suas almas... E pensavam que em agosto o perigo vinha do desconhecido e do acaso, das forças misteriosas e ocultas que regem a essência da natureza, gerando ameaças e provocando desastres de toda ordem. Nas águas dos rios e das lagoas, nos caminhos e nas estradas, nos abismos e precipícios, com fogo, objetos cortantes, animais peçonhentos e até mesmo com cachorros zangados. Loucura, envenenamentos, enforcamentos, afogamentos, suicídios e assassinatos também faziam parte deste

Começou a Semana Santa dos Mulatos em São João del-Rei.

 Mais uma vez, desde o dia 5 de agosto - e até o dia 15 - São João del-Rei está revivendo, como faz desde a segunda metade do século XVIII, uma de suas mais importantes celebrações religiosas. A festa da Boa Morte que, composta por uma novena e duas procissões, dura onze dias. É uma das festividades mais ricas e grandiosas da cidade, tanto que em determinada época ficou conhecida como a "Semana Santa dos Mulatos", por serem predominantemente mulatos os membros da Confraria de Nossa Senhora da Boa Morte. Pelo próprio espírito do que comemora - o sono profundo, a assunção aos Céus, e a coroação de Nossa Senhora pelas três pessoas da Santíssima Trindade -, a parte musical é delicada, leve e gloriosa e reúne obras barrocas de vários compositores locais. Inclusive de compositores do século XX e de nosso tempo. Confira, neste vídeo, o requinte e a complexidade do toque A Senhora Morta , considerado o mais belo e sofisticado de São João del-Rei. É executado da noite do dia 13

Pode a tradição renovar-se a cada instante e continuar genuína? Em São João del-Rei, pode!...

Quem é de São João del-Rei ou conhece, atenciosamente e com interesse, nossa terra, por mais contemporâneo e digital que seja, sabe bem o que é tradição. Afinal, o povo são-joanense conserva e mantém, desde 1704, práticas culturais que aqui surgiram logo que foi criado o Arraial Novo de Nossa Senhora do Pilar e se solidificaram a partir da instituição da Vila de São João del-Rei, em 1713. De lá para cá, passaram-se mais de 300 anos. Aumentaram-se as manifestações, multiplicaram-se os saberes, sofisticaram-se as "festas", intensificaram-se as comemorações, ao mesmo tempo em que se consolidou a identidade são-joanense como uma cultura viva, fundamentada no passado, mas vivificada e vivenciada cotidianamente com grande atualidade. Certamente é por isto que São João del-Rei tanto se destaca em todo o país, quando o assunto é patrimônio imaterial. Mas como isto acontece? É simples: por mais contraditório que possa parecer, na ' terra onde os sinos falam '  a tradiçã

Helvécio Benigno da Silva: uma câmera na mão e muito amor por São João del-Rei e suas tradições

Em São João del-Rei, quem passa pela colonial Rua Santo Antônio vai sempre ser encantado pela magia daquele local. Construída na rota exata que em 1704 era o caminho dos bandeirantes, ela é a via mais poética e mais musical da cidade. Nela, além de Santo Antônio em sua capela, de artistas sacros, compositores, maestros, músicos, de uma banda musical centenária e das duas orquestras barrocas mais antigas das Américas, mora também, na casa número 62, um são-joanense de 57 anos, quase 20 dos quais dedicados exclusivamente a registrar, em vídeos, as tradições religiosas desta terra onde os sinos falam. E por falar em sinos, aqui estamos falando de Helvécio Benigno da Silva que, inclusive, foi sineiro na igreja de São Francisco de Assis. O amor e a intimidade de Helvécio com as festas religiosas de São João del-Rei vem de longa data. Filho de carpinteiro, aprendeu o ofício com o pai, mas logo com o primeiro salário comprou uma câmera fotográfica Minolta, já que o sonho de ter uma filmad