Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de maio, 2012

Corpus Christi em São João del-Rei: São Jorge, muitas oitavas de ouro e o estandarte real

Antes mesmo que maio termine, São João del-Rei já vive os ares do magno dia de Corpus Christi. Pompa, brilho, poder, simbolismo, grandiosidade e devoção contornam a Serra do Lenheiro, atravessam seculares pontes de pedra, correm ruas pés-de-moleque, largos, becos e ladeiras. Desde sempre é assim.´Era assim que mandavam " as ordens de Sua Majestade Real ". Por se tratar da mais importante festa religiosa que nos séculos XVIII e XIX era realizada sob os auspícios da Câmara da Vila de São João del-Rei, sua preparação envolvia diversos atos oficiais, documentos públicos,  propinas e doações anuais,em muitas oitavas de ouro, como as doações de 1738 e 1747: 64 oitavas. Até a música a dois coros, executada durante o cortejo sacro, e as pessoas que carregavam "as varas do pálio, sob o qual ia a custódia sagrada" eram definidas pela Câmara. Naqueles idos, pelo simbolismo e imponência de sua iconografia, ligados à força, luta, vitória, domínio e poder, São Jorge era fi

Retrato saudoso de São João del-Rei

                          Aqui                           em cada ponte                           em cada esquina                           em cada casa                           tem uma cruz                           (para espantar o demônio).                           Em cada coração                           tem um aperto                           tem um peso                           tem um pesar                           tem um sopro.                           E na cabeça                           uma vontade danada                           de já ter vivido                           e morrido                           no tempo do ouro.

Mais uma morada para o Espírito Santo em São João del-Rei

A partir de amanhã, último domingo de maio, Dia de Pentecostes, São João del-Rei revela mais uma das riquezas histórico-culturais que a tornam uma cidade tão singular: a capela do Espírito Santo e o Memorial Natividade. Sua inauguração será às nove e meia da manhã, anunciada pelos sinos de todas as barrocas  igrejas do centro histórico. Tudo começará com um breve ofício religioso na Matriz do Pilar, de onde partirá uma procissão, com as chaves que abrirão para são-joanenses, turistas, visitantes e viajantes as portas desta nova arca do tesouro. O novo espaço de arte, fé e memória fica no ponto mais alto das ladeiras da Muxinga, ao lado dos cemitérios do Rosário e da Matriz do Pilar. O edifício que o abriga, parte é de uma casa do século XVIII, parte é uma edificação recente, construída especialmente com esta finalidade. A história da campela do Espírito Santo, - desde sua construção, em São Vicente de Minas, passando pelos saques que a depredaram, até a inauguração do Me

Palmeiras imperiais, ipês amarelos, lembranças e saudades de São João del-Rei

Em São João del-Rei, valorosos são-joanenses têm saudades. Saudades de si mesmos. Saudades de um tempo que passou como as nuvens de algodão doce e brancas amêndoas de coco distribuídas nas procissões da infância, quando a vida preexistia à memória. Na mesma São João del-Rei, além de si mesmos e do tempo, alguns são-joanenses têm saudades da paisagem. Território de geografias físicas e rios de lembranças, naturalmente perseguido pelo correr dos séculos e duramente castigado pelos homens, no seu moderno desamor e embrutecimento. Sem as palmeiras imperiais, enfileiradas, que se projetavam por detrás do Solar dos Lustosas, imaginariamente na Muxinga, o Largo do Rosário é uma santa sem diadema de prata e estrelas. Com palmeiras acanhadas e de menor imponência, o Largo de São Francisco mostra-se um rei empobrecido, a perder coroa e majestade. Tristemente invejando tão inglório destino, o Largo da Cruz abre mão de suas palmeiras, para também agonizar seu esplendor. Em outros pontos da

Jubileu do Divino Espírito Santo 2012 incendeia o coração flamejante de São João del-Rei

 Imperador Perpétuo do Jubileu do Divino Espírito Santo - São João del-Rei *   É assim desde fins do século XVIII : por ocasião do tempo de Pentecostes, o espírito de Deus , na forma de pomba branca da qual irradiam raios luminosos,  pousa sobre São João del-Rei e, por dez dias,  com suas poderosas línguas de fogo, ilumina a inteligência e incendeia o coração do povo do Campo das Vertentes. Em especial o coração do povo de Matosinhos, pois é naquele movimentado e progressista bairro são-joanense - em cujas imediações dizem ter acontecido em 1709 a sangrenta e traiçoeira Guerra dos Emboabas - que, desde o dia 17 até o dia 27 deste mês, acontecem as celebrações do Jubileu do Divino Espírito Santo. A origem da festa certamente é anterior a 1783, pois este foi o ano em que o Papa concedeu-lhe a importância de Jubileu, título só conferido pela Igreja, na época, a festas já tradicionais e de grande  representatividade junto à população. Segundo o historiador e folclorista

Sem mais palavras: boa semana, São João del-Rei!

 Em São João del-Rei, quando as tardes de maio vespertinamente se despedem, uma a uma, cobrindo o firmamento são-joanense com manto de azul cetim, bordado de estrelas de prata e diamantes, é sinal de que anoitece. Mês de Maria, nos domingos, os sinos serafins, querubinicamente repicam. Ângelus então se espalham pela atmosfera, alegres e ruidosos cambalhoteiam pelas curvas dos telhados de rendilhadas beiras-seveiras, refulgem e se dissipam no brilho dos lampiões coloniais, como a dizer: Boa semana, São João del-Rei!

O samba - astro brilhante - ilumina e esquenta a noite amena de São João del-Rei

Fachada da igreja do Carmo, vista do Solar da Baronesa. 2012. Foto do autor . São João del-Rei, terra onde os sinos falam - e também tocam "batucada" e "batucadinha" -, é também terra do Samba. Por isso, a partir das 20 horas de amanhã, no Largo do Carmo, vários sambas cariocas e são-joanenses se encontrarão para saudar Cartola e Jota D'Angelo, Paulinho da Viola e Pistilim, João Nogueira e Agostinho França, Noel Rosa e Chacal, Paulo César Pinheiro, Zé Keti e muitos outros mestres d'aquém e d'além  Serra do Lenheiro. É o projeto cultural Samba na Praça . As apresentações serão mensais e durante as rodas de samba o Largo do Carmo - tradicional território do samba são-joanense - será dotado de mais conforto e segurança, como merecem são-joanenses e turistas. Quem sabe do projeto Samba na Praça não nasçam outras iniciativas que tornem ainda mais rico, divertido e interessante o carnaval de São João del-Rei? Saudemos a iniciativa! Brindemos e apoiemos o

Chico Brugudum - Patrimônio popular de São João del-Rei

 Por mais que o tempo passe, enfraquecendo sem dó a lembrança dos que são bem-vividos, os são-joanenses octogenários não se esquecem deste apelido nem de seu dono: Chico Brugudum . No dia a dia pintor de paredes, Francisco das Chagas foi um dos tipos populares mais pitorescos, alegres e presentes nos acontecimentos coletivos realizados em São João del-Rei nas décadas de 1930 e 1940. No carnaval, por exemplo, Chico Brugudum era figura certa no Bloco Zero. Nos Sábados da Aleluia, comandava e animava todas as queimas de Judas. Como os embaixadores da alegria, da espontaneidade e da irreverência também partem para o outro mundo, Francisco das Chagas, Chico Brugudum , morreu a 17 de maio de 1946. Certamente mistura-se aos ossos de outros são-joanenses iguais, em um democrático ossuário geral de algum cemitério da cidade. Se você tiver oportunidade de, conversando com amigos e parentes idosos, saber mais sobre Chico Brugudum (e quem sabe até conseguir fotos dele!), não perca est

Em São João del-Rei, anjos barrocos brincam de roda com seu criador: Aniceto de Souza Lopes

 Há quase duzentos anos, ou melhor, há exatamente 198 anos, no dia 15 de maio, São João del-Rei perdia um de seus mais importantes artistas: o arquiteto, construtor e escultor Aniceto de Souza Lopes. Seu nome não é lá conhecido pela maioria da população são-joanense, mas os monumentos que tiveram seu toque de mestre, muito pelo contrário, não há quem não se encante e não se orgulhe deles - as igrejas de São Francisco e de Nossa Senhora do Carmo e o pelourinho, hoje no Largo das Mercês. Aniceto de Souza Lopes era alferes. Na igreja de São Francisco, atribui-se ao seu talento partes da escultura da magnífica fachada, como o relevo do frontão, esculpido em 1809, e a composição da qual fazem parte o Cristo Seráfico e São Francisco ajoelhado, recebendo os estigmas no Monte Alverne. Na igreja do Carmo, muitas são as obras de sua genialidade. Já o pelourinho, esculpido em 1812, está completando este ano dois séculos. A coluna com duas bacias, sobre três degraus, que conhecemos hoje

O ouro branco e líquido de São João del-Rei

Rua da Cachaça ou Rua da Alegria. S.J. Del-Rei. 2011. Foto do autor Quase tão procurada quanto o ouro, a cachaça era um produto muito valorizado nos primeiros anos da Vila de São João del-Rei. Pelos vários poderes da canjibrina, a branquinha servia para tudo - da alegria à medicina popular - e sua fabricação e comércio eram tão expressivos que requeriam regulamentação própria. Tanto que, no dia 15 de maio de 1719, o contratador João da Silva Costa arrematou, por 760 oitavas de ouro, o contrato das aguardentes de cana. Com isso " as pessoas que venderem aguardentes da terra com licença deste contratador não serão obrigadas a tirar licença deste Senado " esclarecia o Edital do Senado da Câmara da Vila de São João del-Rei, publicado naquela data. Memorial imaginário na geografia urbana da cidade, a Rua da Cachaça é clara homenagem a este produto tão típico de nosso país. O nome, dizem alguns, compete com Rua da Alegria, numa alusão à zona de prostituição que ali existiu

Cem anos antes que a ONU, São João del-Rei cantou solenemente o fim da escravidão

Largo do Rosário, Padre José Maria Xavier. S.J. Del-Rei . 2011 . Foto do Autor  A música. Sempre a música a marcar com grandeza e dignidade o ritmo em que bate no peito o coração do povo de São João del-Rei. Sendo assim, foi com música, da melhor qualidade, que os são-joanenses comemoraram o primeiro aniversário da libertação dos negros cativos. Era 13 de maio de 1889. Na igreja do Rosário dos  Pretos, luminosos festejos. No largo em sua frente, a Orquestra Ribeiro Bastos apresentou um concerto solene, em que a música de notas coloridas e alegres ecoou liberdade por todos os cantos. Há um ano estava extinta a escravidão no Brasil. E também revogadas as disposições em contrário... 123 anos depois, a iniciativa se repete. Não mais no Largo do Rosário nem em São João del-Rei, mas em Nova Iorque e na sede das Nações Unidas. Ali, na noite do dia 15 de maio de 2012 acontece o concerto Honrar os Herois, Resistentes e Sobreviventes , em memória das vítimas da escravidão, em todas

13 de maio – Palácio Real da Nobre Nação Benguela. Onde? Em São João del-Rei...

De um modo geral, pouco se conhece - com mais rigor e profundidade - da história dos negros em São João del-Rei . Contudo, alguns estudos mostram que, em fins do século XVIII e por quase todo o século XIX, algumas comunidades negras eram institucionalmente organizadas nesta vila, com a finalidade, inclusive, de preservar a cultura original e fortalecer a indentidade daqueles grupos , bem como prestar assistência e auxílio aos negros mais desamparados. Foi neste contexto que surgiu a "Nobre Nação Benguela" de São João del-Rei , vinculada à Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, com funções que incluíam patrocinar a celebração de missas em favor dos membros falecidos. Entretanto esta prática católica, para os africanos, tinha o sentido de culto aos ancestrais, visando principalmente proteção, união e prosperidade. A "Nobre Nação Benguela" tinha até um "Palácio Real", formado por um conjunto de casas compradas para este fim em 30 de novembro de 1803

Artistas, artífices e artesãos do século XVIII visitam São João del-Rei no século XXI

Em São João del-Rei, a arte brota da terra, desce do céu, barrocamente, no contorcimento de folhas de parreira, de figo e acanto, abraçados a flores, frutos, conchas, pássaros, anjos, arcanjos, querubins e serafins... Espelha, assim, a concepção mítico-religiosa do Paraíso, imaginariamente perdido pela humanidade mal o mundo havia sido criado. Tudo porque Adão e Eva, seduzidos pela serpente, comeram o fruto proibido do conhecimento, cometendo assim, pela primeira vez, o pecado original. Isto é o que constatará quem visitar a exposição Mestres, artífices, oficiais e aprendizes - a escultura e a talha nos séculos XVIII e XIX , que estará aberta ao público a partir da próxima sexta-feira, dia 11 de maio, no Museu Regional, que fica no Largo Tamandaré, na margem do Córrego do Lenheiro, entre as bicentenárias pontes da Cadeia e do Rosário. Composta por obras pertencentes ao acervo do Museu Regional de São João del-Rei - IPHAN, a exposição traz a público retábulos, colunas

Conspiração Gastronômica em São João del-Rei

Largo das Mercês, Pelourinho e Passo da Paixão. SJDel-Rei. Foto do Autor Autêntica de origem, genuína de alma, voluptosa nos ingredientes, barroca no tempero, delicada e sublime no preparo. A cozinha mineira de São João del-Rei é singular, como tudo o que é próprio da cidade. Tutu de feijão preto, decorado com molho de tomate e cebola, linguiça fritinha enrolada em espiral, flores de ovos e folhas de salsa. Para acompanhar? Arroz branquinho e seco, couve bem fina, picada e repicada a mão, lombo suíno assado ou de panela, salada simples, de alface, tomate e limão. Frango a molho pardo ou com quiabo, diante de angu de fubá moinho d'água, macio e cremoso, mexido na hora. Vaca atolada de costela bovina e mandioca; canjiquinha de milho amarelo com costelinha de porco, maneco com jaleco, maneco sem jaleco, bambá de couve e abóbora vermelha, chouriço de sangue de porco com salsinha e pimenta, moela ao molho vermelho, torresmo, chuchu picadinho, abobrinha batida, mugango, mostarda,

São João del-Rei no Dia de Santa Cruz

Três de Maio, Dia de Santa Cruz . Nos dias atuais, a tradição de pendurar, nesta data, cruzes enfeitadas de papel colorido repicado e flores na porta principal das casas do centro histórico de São João del-Rei aos poucos vai se apagando. Em alguns becos escondidos e nos bairros mais afastados, assim como na área rural, isso não só ainda acontece quanto faz parte - autenticamente - do calendário cultural daquela comunidade. O desbotamento desta tradição seria apenas mais um sinal da modernidade, não representasse esse esvaecimento sinal de  grandes perdas. Perda da disposição de tornar especial o que é comum. Perda da vontade de assinalar a passagem do tempo com marcos pequenos porém significativos. Perda da capacidade ver em tudo motivo de festa. Perda da oportunidade de tornar célebre o que é rotina. Perda do entusiasmo que colore o dia a dia. Pela religiosidade que caracteriza esta forma cultural de expressão, a Igreja bem  poderia estimular e apoiar seu resgate. Do mesmo modo,

Quilombos e neoquilombos de São João del-Rei

Quem hoje vivencia, conhece ou assiste a " afro . moreni . mineiridade " são-joanense não imagina que foi na Comarca do Rio das Mortes - cuja sede era a Vila de São João del-Rei - que na primeira metade do século XVIII surgiram e se fortaleceram dois dos maiores quilombos mineiros: o Quilombo do Ambrósio e o Quilombo Grande. Precursor do Quilombo Grande, o Quilombo do Ambrósio chegou a ter uma população de 1.000 negros. Era um sistema comunitário, onde os quilombolas se distribuíam em grupos organizados para desempenhar diferentes funções importantes para a sobrevivência da comunidade. Os excursionistas ou exploradores assaltavam fazendas e caravanas; os campeiros e criadores criavam gado, os caçadores buscavam animais e carne nas matas e os agricultores plantavam, cuidavam das roças e produziam açúcar e farinha. Mas também destilavam aguardente, de tão boa qualidade que inspirou um ditado popular ainda hoje muito conhecido em São João del-Rei: " cachaça do quil