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Mostrando postagens com o rótulo Orquestra Lira Sanjoanense

São João del-Rei persiste na "estranha mania de ter fé na vida!"

Quase nunca é um dia comum no centro histórico de São João del-Rei. Aliás, para ser mais exato, também quase nunca é uma noite comum no centro histórico de São João del-Rei. Basta ouvir os sinos de alguma das várias igrejas barrocas e sair pelas ruas e largos coloniais para ver que alguma coisa vai acontecer em breve. Se já não estiver acontecendo... Na verdade, nenhuma cidade histórica brasileira possui uma religiosidade tão forte e tão intensa quanto São João del-Rei e nem a vive no dia a dia, com tamanho entusiasmo e alegria. Aliás, sem falsa modéstia, com tamanho brilho e felicidade. É por isto que aqui os sinos falam e tudo é festa: Festa dos Passos, Festa do Espírito Santo, Festa do Carmo, da Boa Morte, das Mercês, Festa de São Benedito, do Bonfim, e tantas outras. O coroamento das Festas acontece sempre com uma (ou mais) grandiosa procissão. Não são raros os meses em que acontecem duas ou três, e até mais. Neste junho (2023), por exemplo, foram quatro, duas, inclusive, em uma ún...

Em São João del-Rei, cultura não é evento nem espetáculo. É vida!

Em São João del-Rei, a cultura não é espetáculo. É a própria vida. E também não é evento. Pelo contrário, nesta terra a cultura cumpre-se naturalmente. Faz parte do cotidiano, pontuando o passar do tempo, o correr dos dias, o mudar das estações, o escorrer da existência. Emoção, beleza, tradição, delicadeza, sentimento, recordação, crença, imaginação, verdade - arte para todos, por toda parte. Cultura e arte constituem de tal modo a realidade do centro histórico, que praticamente não são percebidas como tal, pelos próprios são-joanenses, nem próximos, nem distantes. O que em outras cidades seria visto e valorizado como um raro acontecimento extraordinário, entre nós é algo que já foi incorporado à nossa essência e faz parte de nosso dia a dia, resgatando, refazendo, reavivando efortalecendo nossos laços com nós mesmos. Com nossas memórias, nossas lembranças, nossas origens, nossas energias vitais e nossas emoções ancestrais. Principalmente (e muito principalmente!) preservada tanto com...

As boas coisas de São João del Rei: café, música e arte na Rua Santo Antonio

  É um sacrilégio, quase um crime ou pecado mortal, ir a São João del Rei e não passear calmamente pela Rua Santo Antonio. É algo mais ou menos como ir à Cidade do Rio de Janeiro e não ver o mar, ou como ir a Roma e não ver o Papa! A tricentenária, estreita, poética, misteriosa e sedutora rua ainda hoje é a morada de muitos tesouros, guardados nos baús da música barroca, da história e da arquitetura colonial. O consagrado compositor sacro Padre José Maria Xavier, por exemplo, nasceu nela, em 1819. A Banda de Música Theodoro de Faria (1902), a bicentenária Orquestra Ribeiro Bastos (1790) e a Orquestra Lira Sanjoanense, que é a mais antiga orquestra das Américas em funcionamento ininterrupto desde a sua fundação, em 1776, têm suas sedes e arquivos naquela rua. Consta que a Lira Sanjoanense, inclusive, foi a primeira corporação musical profissional instituída no Brasil. Por tudo isto, poeticamente, a Rua Santo Antônio bem poderia se chamar também Rua da Música. A capela de Santo Antôn...

Via Sacra e Encomendação de Almas. Magias da Quaresma em São João del-Rei

Quaresma é uma era diferente em São João del-Rei. Talvez seja a era anual de São João del-Rei. Sendo assim, as  sete sextas-feiras da Quaresma, então... Até quem não é nativo, ou mesmo os são-joanenses alheios às tradições e à identidade local - enfim, qualquer pessoa que nestes dias transitar pelo centro histórico ou pelos bairros mais antigos da cidade - vai notar algo diferente no ar. Atmosfera mais densa, clima espesso e misterioso, ecos da reza de algum terço, esgarçado e trazido entrecortado e de longe pelo vento, dobre longo, solitário e choroso de um sino, expectativa contraditória  quanto à Paixão e à compaixão, à dor e ao gozo, à festa que é  sofrimento. O silêncio conversa nas esquinas, nas pontes, nas encruzilhadas, nos largos e seus cruzeiros. Espreita das janelas de guilhotinas, escorre nas pedras do chão, escorrega, sorrateiro, pelas bicas dos telhados. Conversa com as pessoas que passam, com suas memórias, lembranças e pensamentos. À noite, tem...

Uma noite de serenidade, delicadeza e encantamento em São João del-Rei

Serenidade e delicadeza. Estas duas palavras são o espelho da noite do dia 14 de agosto em São João del-Rei. Uma noite suave e amena, às vezes fria, em que o centro histórico são-joanense parece envolvido por um silêncio de paz e coberto por um céu azul claro de nuvens tênues, que se movimentam lentamente, esgarçadas pela luz branca de uma lua cheia discreta e contemplativa. Mas essa atmosfera de tanta beleza e calma certamente seria menos percebida, se não fosse nela que Nossa Senhora da Boa Morte sai às ruas de pedra e tempo, adormecida em seu esquife, enfeitado de flores claras e conduzido por padres vestidos de branco. Aliás, essa atmosfera talvez só exista, como presente do firmamento ao povo de São João del-Rei, para nela deslizar o cortejo que conduz Nossa Senhora. Nesse momento, incapaz de ser medido na escala do tempo, por seu misterioso encantamento que funde, em uma mesma era, passado e eternidade, tudo é reticentemente mágico e sem-fim. De tempos em tempos, no desl...

O Natal de São João del-Rei é encantado e dura quase um mês!

Nem todos percebem, mas o Natal em São João del-Rei dura muito tempo, quase um mês. Começa no dia 15 de dezembro, com a Novena do Menino Jesus, na Igreja do Rosário, e vai até o dia 6 de janeiro, quando se festeja o Dia de Reis. Assim como o Ano Novo, com quem se abraça e se embaraça, o Natal, como um todo, é uma festa ao mesmo tempo sacra, religiosa e profana, pois em São João del-Rei envolve de tudo um pouco. Rezas populares, tradições barrocas, encenações teatrais, montagem de presépios, ceia e almoços com gastronomia própria, comemorações sociais, foguetes, toque de sinos, confraternizações de amigo oculto, troca de presentes, folias de reis e pastorinhas, enfim uma epopéia de felicidade, intensa como uma maratona festiva A Novena do Menino Jesus é um capítulo à parte. Realizada na Igreja do Rosário, edificada pela Irmandade mais antiga da cidade e uma das 3 mais antigas do Brasil, fundada em 1708, foi composta pelo compositor Padre José Maria Xavier e desde sempre é executa...

Em São João del-Rei, janeiro é tempo do glorioso mártir São Sebastião

Estamos às vésperas da festa de São Sebastião, que começa amanhã com uma novena noturna, e toques de sinos ao meio dia, às três e às seis da tarde, na Matriz do Pilar. Em grande parte cantada pela Orquestra Lira Sanjoanense, com repertório composto por músicos são-joanenses especialmente para esta data, a novena (vídeo abaixo) se repete diariamente às sete da noite até o dia 19 - dia 20, consagrado ao santo a cerimônia é outra: uma procissão que sai pelo lado direito da Matriz à Hora do Ângelus e, ao som da Banda de Música, segue rumo ao Largo das Mercês, atravessa o Largo da Cruz, cruza o Largo do Carmo e retorna pela à Catedral, onde tudo termina com um Te Deum Laudamus. Guerreiro, São Sebastião vence e afasta para longe a "peste, a fome e a guerra", pelo que sua devoção é muito difundida em São João del-Rei desde a época em que surgiu o Arraial Novo de Nossa Senhora do Pilar do Rio das Mortes. Sua festa é das poucas que unem o erudito e o popular. Além da novena, pro...

A estrela de Davi, a Epifania e os Reis Magos em São João del-Rei

Por mais que se pense conhecer a riqueza cultural de São João del-Rei, constantemente uma antiga, mas impensada, prática cultural se mostra, revelando que a memória da cidade é imensurável e inesgotável. No conjunto das manifestações religiosas do ciclo natalino, é tradição, no dia seis de janeiro - Dia dos Santos Reis - as pessoas escreverem, no lado de dentro da porta principal de suas casas, o nome dos três reis magos do Oriente que foram ao encontro de Jesus recém-nascido: Gaspar, Baltazar e Belchior (ou Melchior). Esta prática é conservada principalmente pelas pessoas mais velhas e em alguns casos inclui até o desenho de uma estrela de seis pontas - a estrela de Davi - entre os mais simples conhecida como "cinco Salomão" (signo de Salomão). É possível que este símbolo judaico tenha a intenção de lembrar a estrela de Belém, que guiou os magos em sua longa jornada pela noite escura. O que nem todo mundo sabe é que tal inscrição (nomes e símbolos), para ter efeito p...

Em São João del-Rei, até defuntos e cemitérios comemoram aniversários. Sabia?

Na tradição popular, novembro é o mês dos mortos e, em São João del-Rei, esta característica do penúltimo mês do ano é reforçada diversas vezes. A partir do dia 2, quando se celebra Finados, começam as missas aniversárias dos defuntos que pertenceram a uma, ou a várias, das dez Irmandades bicentenárias, sediadas no centro histórico são-joanense. Também conhecida como "aniversário dos cemitérios", a cerimônia é composta de duas partes. Começa com uma missa, na igreja que é sede da Irmandade, onde, no centro da nave estão dispostos, no chão, um tapete preto, com galões e uma grande cruz dourados e bordados. Em cada uma das quatro pontas, um castiçal alto, com uma vela acesa, como se estivesse aguardando um defunto para a oração final. Terminada a missa, os sinos tocam exéquias e os irmãos saem em procissão, vestidos com suas opas ou hábitos, e assim vão até o cemitério correspondente, onde o padre faz orações fúnebres. Tudo - missa e orações no campo santo - ao som de mú...

São Miguel Arcanjo. Há 300 anos Príncipe da Milícia Celeste protege São João del-Rei

Faz mais de 300 anos que São Miguel Arcanjo chegou a São João del-Rei, ainda Arraial Novo de Nossa Senhora do Pilar do Rio das Mortes. Aqui, ele viu o ouro brotar da terra e, por cobiça humana, facões e espadas crisparem seus metais, acendendo no ar raios e relâmpagos. Arcabuzes lançarem pólvora e estouro de trovão e até o Córrego do Lenheiro correr tinto de sangue na Guerra dos Emboabas. Há quem diga que, sinal de sua força e poder, ele escapou das chamas que incendiaram a primitiva capela de Nossa Senhora do Pilar, no Morro da Forca, saindo a salvo na companhia de seu vizinho, o guerreiro e mártir São Sebastião. Vencidas as chamas e abrandado o calor das pedras em brasa, em 1716 São Miguel criou seu exército humano na recém-criada Vila de São João del-Rei: a Irmandade de São Miguel e Almas. Desde então, toda segunda-feira é saudado com uma missa vespertina e no mês de setembro festejado com muita oração e especial louvor. Depois de um tríduo noturno, de leituras e cânticos bar...

Salve São João del-Rei. Salve setembro. Salve tudo o que aqui faz a vida ficar melhor e mais bonita!

Mal setembro anuncia sua primeira alvorada e em São João del-Rei a primavera se antecipa, florescendo pétalas de fé. De toda parte exala aroma doce de orvalhada flor de laranjeira, de inocentes manacás umedecidos de sereno e brisa, de jasmins mansinhos e repicados como se fossem vegetais estrelas de papel. Nem precisa ser noite. O amanhecer ou o entardecer já bastam. O nono mês do ano é suavemente santo à sombra da Serra do Lenheiro. Faltam-lhe horas, dias e noites para tamanha devoção. Senhor do Monte, Bom Jesus de Matosinhos, São Francisco em chagas, Nossa Senhora das Mercês, São Miguel Arcanjo, Anjo da Guarda. Setembro precisaria ter 40 dias para caber, dia a dia, toda a são-joanense liturgia. Ser trinta por cento maior. Os sinos não param. A orquestra canta continuamente. Aqui e ali, foguetes estouram sua alegria e fogos de artifício riscam o céu. Anjos infantis dobram esquinas, em meio a brancas nuvens de incenso e de algodão doce. As bandas tocam marchas alegres, enquanto ...

A música de São João del-Rei é a afilhada preferida de Santa Cecília.

São João del-Rei é terra abençoada. Santos e anjos que moram na corte celestial habitam também a terra que tem no nome uma homenagem ao Rei Sol português, D. João V. Entre as tantas divindades que habitam o firmamento, mas que não tiram os olhos do povo são-joanense, uma, inclusive, fica mais na cidade do que no céu. É Santa Cecília! Mas pudera: como desde 1717 a Música firmou morada em São João del-Rei, aqui a santa tem para cuidar quatro bandas de música e três orquestras, vários corais, grupos de câmera, duos, trios e quartetos, muitos maestros, sineiros e compositores, sempre em permanente atividade. Nas igrejas, nos teatros, nas praças, nas ruas, nos auditórios. E como Santa Cecília é padroeira dos músicos, não é sem motivo que ela está em toda parte... Mas aqueles a que a santa dedica tanto olhar e zelo não lhe são ingratos. Deram-lhe lugar de honra, em um dourado altar lateral da Matriz e Pilar, e a guardam consigo, em imagem ou estampa, na sede da Orquestra Ribeiro ...

Líricos e poéticos becos de São João del-Rei: Beco do Salto, veiazinha de um coração colonial

O Beco do Salto é como uma veiazinha estreita e acanhada, na aurícula mais colonial do coração histórico de São João del-Rei. Unindo a Rua Santa Teresa à Rua Santo Elias e desaguando em esquina da casa mais antiga da cidade, tem por vizinhos próximos, quase porta a porta, uma grande pedreira com uma mina de ouro, a igreja e o Cemitério do Carmo, o Chafariz da Municipalidade, o Largo da Cruz, o Largo do Carmo e a Sociedade de Concertos Sinfônicos de São João del-Rei. Tão grande e por tanto tempo foram sua timidez e autoabandono que suas casas quase se autoarruinaram. Hoje, com restaurações, estão novamente reforçando sua face de outros tempos. A memória nacional ganha com isto. Personagens famosos, verdadeiramente importantes na cultura musical de São João del-Rei, moradores de um pequenino sobrado no Beco do Salto, foram o violinista Geraldo Ivon da Silva, o Geraldo Patusca, e sua primeira esposa, Maria José, a Maricota - ambos músicos da Orquestra Lira Sanjoanense. Ali, sob esta...

Pai da Música é "patusca"* e vive em São João del-Rei

A arte eterniza, desafia o tempo . Ainda mais a Música, que é etérea - puro sentimento. São João del-Rei sabe isso de cor e tem como prova incontestável o violinista Geraldo Ivon da Silva, o popular Geraldo Patusca . Às vésperas de completar, em 10 de julho próximo (1911), o seu 95º aniversário, Geraldo Patusca tem de música muito mais do que muita gente bem vivida tem de idade .  Mais de oitenta anos (exatamente  80 anos, 7 meses e 15 dias) dedicados  a tocar violino na Orquestra Lira Sanjoanense e na Sociedade de Concertos Sinfônicos de São João del-Rei. Assim, este são-joanense mulato, místico, religioso e cortês, sempre vestido de terno azul marinho, deve ser um dos músicos mais velhos de Minas Gerais. Sobre o começo da carreira musical de Geraldo Patusca, quando o violinista completou o seu 80º aniversário, em 1996, o historiador Sebastião de Oliveira Cintra escreveu: " Foi a 15 de setembro de 193...