![]() |
Procissão do Encontro no Largo da Cruz (c. 1978) - Foto do autor |
O sino dos Passos, plangendo agora para anunciar o fim do primeiro ofício do Setenário das Dores, é um convite a pensar: a autenticidade das tradições culturais religiosas de São João del-Rei surpreende e encanta. Surpreende não apenas pela notória fidelidade das práticas litúrgicas e paralitúrgicas às suas origens mais remotas, muitas delas surgidas nas primeiras décadas do século XVIII.
Encanta principalmente por sua fulgurante vitalidade. Longe de serem representações ou encenações, mais do que lembrança e memória, as tradições culturais religiosas de São João del-Rei são a própria religiosidade do povo são-joanense. Brilham nos olhos, batem no coração, pulsam nas veias, transpiram nos poros, adoçam a boca, confortam o espírito.
Este modo devotado de sentir e de viver o tesouro que veio do passado - mais do que do século XVIII, o sentimento que veio de um tempo imemorial e aqui materializou-se em expressão e arte nos anos setecentos - é o que faz do são-joanense um povo diferente. Aquele que consegue transitar com integridade entre o barroco e a pós-modernidade. Entre a couve com angu e o fast food, o fogão de lenha e o forno microondas. Entre a mandinga e a medicina. Entre o pragmatismo científico e a liberdade artística. Entre o toque dos sinos e a internet. Que subvertendo a ordem vigente, coloca a atualidade a serviço do que surgiu ontem e atravessou séculos até nossos dias. Que inconscientemente zela e preserva sua própria origem e alma, revelando-as e divulgando-as sobretudo para si mesmo, com absoluto respeito e profunda admiração, sem folclorizá-las nem espetacularizá-las.
Coisas boas do povo de São João del-Rei!
Comentários
Postar um comentário