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Viva os santos negros São Benedito e Santa Efigênia! Viva a afromineiridade de São João del-Rei!...


Cada vez mais as manifestações populares da cultura negra se mostram presentes no cotidiano de São João del-Rei, inclusive nas celebrações religiosas da igreja católica. Prova disso é que começaram ontem (19) e vão até o próximo domingo (22), no bairro de Matosinhos, as festas em louvor a São Benedito e a Santa Efigênia. De modo temporão, São Sebastião também será lembrado.

A festa religiosa dura três dias, tem missa e tríduo, mas seu colorido especial fica por conta da atuação do Grupo de Congado São Benedito e São Sebastião, que dará ritmo a uma caminhada, fará uma alvorada festiva, levantará os mastros dos santos homenageados e encabeçará um cortejo solene com as imagens de Santa Efigênia, São Benedito e São Sebastião.

À presença de Santa Efigênia nas Minas Gerais do tempo do ouro, guiando e protegendo os negros em tão cruel sociedade colonial, no clássico Romanceiro da Inconfidência, Cecília Meireles escreveu o seguinte poema:

               ROMANCE IX OU DE VIRA-E-SAI                 
                  
                  Santa Ifigênia, princesa Núbia,
                  desce as encostas, vem trabalhar,
                  por entre as pedras, por entre as águas,
                  com seu poder sobrenatural.

    Santa Ifigênia levanta o facho,
    procura a mina do Chico-Rei:
    negros tão dentro da serra negra
    que a santa negra quase os não vê.

                                  

                                   Ai destes homens, princesa núbia,
                                   rompendo as brenhas, pensando em vós!
                                   Que as vossas jóias, que as vossas flores
                                    aqui se ganham com ferro e suor!

                    

                     Santa Ifigênia, princesa núbia,
                     pisa na mina do Chico-Rei.
                     Folhagens de ouro, raízes de ouro
                     nos seus vestidos se vêm prender.

          

           Santa Ifigênia fica invisível,
           entre os escravos, de sol a sol.
           Ouvem-se os negros cantar felizes.
           Toda a montanha faz-se ouro em pó.

                         

                          Ninguém descobre a princesa núbia,
                          Na vasta mina do Chico-Rei.
                          Depois que passam o sol e a lua,
                          Santa Ifigênia passa também.

                                       

                                        Santa Ifigênia, princesa núbia,
                                        sobe a ladeira quase a dançar.
                                        O ouro sacode dos pés, do manto,
                                        chama seus anjos, e vira-e-sai.

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