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Irmandade do Rosário dos Pretos de São João del-Rei. A mais antiga irmandade negra de Minas Gerais


1º de junho de 1708. Nesta data foi fundada, em São João del-Rei, a mais antiga irmandade dos negros de Minas Gerais - a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos. Ela é, também, a mais antiga irmandade religiosa de São João del-Rei. Exatamente em 1708 começava na região a sangrenta Guerra dos Emboabas e o Arraial Novo de Nossa Senhora do Pilar do Rio das Mortes, com apenas quatro ou cinco anos de existência, sequer havia sido elevado à categoria de Vila.

Sua igreja - a primeira a ser construída no lado esquerdo do Córrego do Lenheiro, datada de 1719 - é considerada a mais antiga entre as ainda hoje existentes na cidade. Isto porque a capela de Nossa Senhora do Pilar que a precedeu, situada na margem direita do mesmo córrego, no Morro do Bonfim / alto do Morro da Forca, foi incendiada no conflito entre paulistas e emboabas, em 1709.

Apesar de ter sido, nos séculos XVIII e XIX, uma agremiação de escravos, a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos era uma instituição forte, o que demonstra como era importante e socialmente representativa a presença dos africanos em São João del-Rei. Tanto que a irmandade chegou a ter, até, uma "embaixada" - a nobre nação benguela -, que favorecia a reunião dos negros com a finalidade específica de fortalecer sua cultura. Irmandade e embaixada socorriam os irmãos negros desamparados, desasssistidos e necessitados.

Ainda hoje, no calendário religioso de São João del-Rei, a Irmandade do Rosário é responsável pela festa do Natal, com novena, tencões, Te Deum e rasoura do Menino Jesus. Também é em sua igreja que começam as comemorações da mais tradicional Semana Santa são-joanense, no Domingo de Ramos, com cânticos barrocos e saída de procissão para o Ofício de Ramos e Canto da Paixão, na Matriz do Pilar.

Aliás a própria localização da igreja do Rosário, rodeada de imponentes casarões em um largo desde sempre endereço da elite e em situação de igualdade geográfica, urbana e social com a Matriz do Pilar e com a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, é prova inconteste da força, reconhecimento e expressão que a comunidade negra conquistou em São João del-Rei e desfruta deste os tempos coloniais setecentistas.



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Sobre o mesmo tema, leia também
http://diretodesaojoaodelrei.blogspot.com.br/2011/05/13-de-maio-sao-joao-del-rei-teve.html

Comentários

  1. Porém, hoje, os negros congadeiros não podem tocar na igreja do Rosário localizada no centro, uma proibição racista do padre que nos desvaloriza e desconsidera a história de resistência
    Por isso foi construída com próprios recursos uma capela no São Dimas, onde podemos tocar.

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    Respostas
    1. Amigo Unknown, penso que toda realidade é dinâmica, e muitas vezes as injustiças de toda ordem conseguem ser reparadas por força da resiliência na informação que fortalece pleitos legítimos. Acreditemos e insistamos!

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