A verdadeira rainha do Carnaval de São João del-Rei não desfila na passarela. Não se agita com a batucada, nem repete o requebrado dos becos tortos e das vielas estreitas. Não se perturba com os delírios nem desvairios da carne pulsante e ardente. Soberana e serena, olha tudo do alto, com seu fino diadema de prata, destacando no manto azul.
Dizem que ela é nova, mas sua idade, ninguém sabe. O que se sabe é que ela chegou por aqui muito antes dos primeiros bandeirantes que vieram em busca do Eldorado. Que ela viu nascer o Arraial Novo de Nossa Senhora do Pilar, assistiu aflita a Guerra dos Emboabas, testemunhou o batismo de Tiradentes, o casamento de Bárbara Eliodora, a chegada da estrada de ferro, a passagem de Dom Pedro, a partida dos soldados são-joanenses para a guerra, entre tantas coisas que aconteceram nestes trezentos anos.
Na euforia, na sedução, na lascívia e no torpor do Carnaval, pouca gente vê quando a lua nova, por volta das seis da tarde do domingo, segunda e terça feira gorda, vem se despedir do sol, de entre as torres da igreja do Rosário. Verdadeira rainha do Carnaval de São João del-Rei, em poucos minutos ela completa lentamente seu suave movimento e, com seu leque de brisa e manto de estrelas, descai silenciosa atrás da Serra do Lenheiro.
Houve um tempo em que ela tinha uma corte de pastoras sorridentes, cheirando a rosas, que saudavam seus encantos. Depois, conquistou um negro nobre e garboso que, apaixonado de entorpecido amor, cantava só para ela. Eram os ranchos carnavalescos Lua Nova e Príncipe da Lua, saudosos, com seus passoa lentos, ao som de marchas lânguidas e dolentes.
Mas isto tem setenta, oitenta, certamente quase noventa anos. E ninguém mais sabe ou lembra...
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