Dentro de poucas horas, São João del-Rei já estará na glória do dia de Nossa Senhora do Carmo. Alvorada festiva, sinos dobrando, gente arrumada chegando no largo e na igreja, missas cantadas, adorações, horas santas, música barroca, procissão, estandartes, crianças vestidas de anjo, tapete de flores, banda tocando, cheiro de incenso, de pipoca, de beijo quente de coco e de amendoim, perfume forte de mulher no ar, foguetes ruidosamente estrelando de cores o luzeiro celeste. Tudo tal qual se fazia há quase três séculos, para agradar o Céu e a Terra. Com tanta intensidade, entusiasmo, fé, cor e luz, talvez não seja assim em nenhuma outra cidade.
Tão antiga quanto a festa do Carmo - e envolvendo o magnífico templo - é uma crença que ouvi, na infância, de minha avó, Francisca Maria da Conceição (1898 - 1994).
Nos idos anos 60, eu criança pequena ela me dizia que sua mãe jurava que sua avó contava que o Rio Jordão, onde Cristo foi batizado, corria debaixo da igreja do Carmo. Que na calada da noite, quem deitasse no assoalho, fechasse os olhos e encostasse o ouvido nas tábuas, escutaria a água correndo e até a serpente - que tentou Adão e Eva no Paraíso - mesmo dormindo se mexer, sacudindo o chocalho e o mundo. Que se a serpente acordasse as estrelas caíam e o mundo acabava. Por isso estava presa debaixo da casa de Nossa Senhora...
Como eram ricos a imaginação e o imaginário dos são-joanenses de antigamente. Como estas estórias e lembranças vêm se desbotando com o tempo, se apagando nas noites, se perdendo entre os dias, apesar de tantos recursos tecnológicos que tudo documentam, registram e espalham para todos os cantos do planeta. Viva o trabalho do folclorista Ulisses Passarelli!
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Deliciosa narrativa!!! Evoca a própria ancestralidade humana, mítica-mística.Obrigado, Emílio, por mais esta rica contribuição e em particular, pela generosidade para com meu trabalho.
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