Sua história, todo mundo sabe: não teve madrinha, era o quarto de nove irmãos, ficou órfão de mãe aos 9 anos, tornou-se dentista - daí o apelido Tiradentes - e alferes de cavalaria. Foi o grande idealizador da Inconfidência e o único sumariamente castigado com o sacrifício da morte em forca, diante da multidão. Esquartejado, seu corpo, antes suspenso no cadafalso, novamente fora elevado, em partes, pelos caminhos onde andou.
Transformado em símbolo, Tiradentes tornou-se um ente abstrato. Uma lembrança distante na cidade onde, historicamente, em 1746, ficava a Fazenda do Pombal. É nome de uma avenida importante, no centro cidade, e estátua em outra, face a face - quem sabe em diálogo - com a de Tancredo Neves. Mas não se transformou em um mito e, por isto mesmo, não povoa muito o imaginário dos são-joanenses. De algum modo, isto é compreensível. No período colonial foi considerado traidor da Coroa Portuguesa, praticante do crime de lesa-majestade, desonrado, derrotado e fracassado. Por isso, o desfecho de sua história por muito tempo não fazia bem para a autoestima de seus conterrâneos. Muito pelo contrário...
Às vezes, percebe-se que isto está mudando. Nas últimas décadas viu-se a cidade se mobilizar pelo reconhecimento como terra natal de Tiradentes, condição que mineiramente, de forma política buscando não desagradar a ninguém, foi partilhada, ignorando-se uma divisão geopolítica histórica. O bicentenário da Inconfidência Mineira foi celebrado com grandiosidade em São João del-Rei, com eventos que tiveram grande repercussão nacional, inclusive em segmentos políticos importantes como a Presidência da República.
Este ano já se encontrou, em uma loja de souvenirs do Largo do Rosário, uma escultura de papel marchê do herói Tiradentes, executada por um artista popular, representando o mártir, certamente na hora do enforcamento. Na prateleira para venda, ela estava ao lado de outra escultura de um são-joanense famoso, até hoje muito cultuado e, mesmo morto, muito festejado: Tancredo Neves. Ao fundo, como cenário, em relevo, a delicada e pequenina capela são-joanense de Santo Antônio.
Mesmo sem ter sido intenção, nem do artista, nem da dona da loja, que dispôs as peças na prateleira, este arranjo era uma expressão plástica - uma instalação. Colocou, em um mesmo tempo histórico e em um mesmo território, dois são-joanenses que figuram importantes na história nacional. Não levou Tancredo Neves para o século XVIII, mas trouxe Tiradentes para São João del-Rei do século XXI.
Que Tiradentes, agora com 267 anos, continue entre nós, inspirando nossas atitudes cidadãs e nossos artistas, eruditos e populares, nas suas criações. Pintores, escultores, ceramistas, músicos, atores, diretores de teatro, cineastas, chefs, produtores, professores, videomakers, bordadeiras, santeiros, escritores, cantores, carnavalescos, cantadores, repentistas, artistas plásticos, designers, webartistas, multimídias e muito mais...
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