O tempo muda, fica diferente em São João del-Rei quando chega a Semana Santa. A cidade se recorta e descola do universo, emerge para um espaço próprio de tempo e lugar. Nesses dias o são-joanense transita entre quatro eixos - o pessoal, enquanto indivíduo; o religioso, enquanto ser; o coletivo, enquanto elemento integrado a uma comunidade, e o de memória, esta, afetiva, sentimental e até mesmo ontológica.
Finda a Quaresma, as primeiras manifestações da Semana Santa propriamente dita são muito profundas e enigmáticas em São João del-Rei. A cerimônia da benção dos ramos, na igreja do Rosário, o toque angustioso e demorado dos sinos daquela igreja, a procissão que sai até a Matriz do Pilar, onde acontece o Ofício de Ramos com a leitura teatralizada do Evangelho - tudo traz em si uma expectativa do obscurecer da glória, da alegria e da vida, vive-se ali a antecipação emocional do sofrimento e do apagar-se. O cordeiro sabe de seu destino e, entre resoluto e resignado, caminha para o sacrifício. Isto é o que nos dizem o olhar e o gestual do Senhor do Triunfo.
Em 2020 não será assim. A realidade mundial assustadora do novo coronavírus 19 impôs outra ambiência para a Semana Santa da "terra onde os sinos falam", que este ano será celebrada sem público e a portas fechadas, com transmissão ao vivo pela internet (site e facebook da Diocese de São João del-Rei) e por emissoras de rádio.
A Igreja está fazendo a sua parte, utilizando os recursos tecnológicos ora disponíveis para levar, virtualmente, algumas celebrações até os fieis, mas sabemos que, por mais avançada que seja, a tecnologia não consegue proporcionar as mesmas sensações, os mesmos sentimentos e a mesma emoção que se vivencia presencialmente em momentos tocantes, como os Ofícios de Trevas, o Sermão das Sete Ultimas Palavras de Jesus Cristo na Cruz e o Descendimento da Cruz.
Agora cabe aos são-joanenses fazerem a sua parte para manter acesa, na lembrança, a vivência das tradições que há 300 anos fazem de São João del-Rei um lugar único no mundo.
Como fazer isso? Relembrando detalhadamente as cerimônias, suas cores, suas músicas e seus aromas, conversando em casa sobre casos e fatos vividos nestas ocasiões e até mesmo procurando no Youtube e em outras redes sociais vídeos e outros registros sobre a Semana Santa de São João del-Rei.
Se além da saúde e da vida existe algo que o coronavírus não pode ameaçar nem enfraquecer é nossa constituição identitária, forjada nas tradições e vivências culturais de nossa terra, entre elas a Semana Santa de São João del-Rei!
Veja abaixo a transmissão ao vivo da Missa de Ramos
Texto s foto (2019): Antonio Emilio da Costa
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