Pular para o conteúdo principal

São João del-Rei não é só paisagem urbana. É paisagem humana!


São João del-Rei não é só uma paisagem urbana. Muito mais do que isso, São João del-Rei é uma paisagem humana. Os largos, os becos, as praças, as ruas tem vida, pulsam esperança, respiram gentileza, transpiram sonho, sonham saudades. São João del-Rei é são-joanense.

Cidade e gente são uma coisa só, indissociáveis. Tanto que, mais do que em outros lugares, São João possui personagens emblemáticos, sem os quais não se consegue imaginar determinados territórios. O tempo passa, as vidas vão, mas os personagens permanecem na memória de quem os conheceu, impregnados na paisagem da qual faziam parte. Que bom que é assim, pois a memória eterniza.

Alguém consegue imaginar o beco atrás da igreja do Rosário sem o Murilo, da bicicletaria? Difícil, não é? Pois é...

Em fins do ano passado, bicicletaria fechada, ele andou sumido e fez muita falta. A saúde lhe requisitava cuidados, mas seu lugar estava guardado naquele cantinho antigo, amigo e poético. Seu lugar estava guardado nas procissões, que ele tanto gostava de ver. Seu lugar estava guardado no coração dos amigos e de todos que passavam naquela viela e recebiam dele alguma cordialidade. Bom dia. Cuidado que vem chuva. Já foi tomar vacina? O frio não tá pra brincadeira. Amanhã vai ser melhor. A gente vai levando. enquanto pode e Deus deixa...

Foi uma alegria quando Murilo voltou. Parece que até o desbotado da parede do casarão da esquina, que dava o porão para a bicicletaria, recuperou a cor, ficou mais azul. O céu ficou mais azul, feliz para combinar com a camisa azul de nosso amigo.

Neste domingo, às 3 da tarde, ouvi o sino de São Gonçalo tocar triste. Sabia que era alguém dando adeus, mas não pensei que fosse nosso amigo se despedindo. Se despedindo não, só avisando que ele vai continuar lá, atrás da igreja do Rosário, sorrindo generoso para nós e semeando as mesmas gentilezas. A gente não vai ver, mas vai sentir que ali bem perto está alguém que honrou a vida e continua vivo, para sempre, na eternidade.

...................................

Texto  e foto: Antonio Emilio da Costa



Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Debaixo de São João del-Rei, existe uma São João del-Rei subterrânea que ninguém conhece.

Debaixo de São João del-Rei existe uma outra São João del-Rei. Subterrânea, de pedra, cheia de ruas, travessas e becos, abertos por escravos no subsolo são-joanense no século XVIII, ao mesmo tempo em que construíam as igrejas de ouro e as pontes de pedra. A esta cidade ainda ora oculta se chega por 20 betas de grande profundidade, cavadas na rocha terra adentro há certos 300 anos.  Elas se comunicam por meio de longas, estreitas e escuras galerias - veias  e umbigo do ventre mineral de onde se extraíu, durante dois séculos, o metal dourado que valia mais do que o sol. Não se tem notícia de outra cidade de Minas que tenha igual patrimônio debaixo de seu visível patrimônio. Por isto, quando estas betas tiverem sido limpas e tratadas como um bem histórico, darão a São João del-Rei um atrativo turístico que será único, no Brasil e no mundo. Atualmente, uma beta, nas imediações do centro histórico, já pode ser visitada e percorrida. Faltam outras 19, já mapeadas, dependendo da sensi

Em São João del-Rei não se duvida: há 250 anos, Tiradentes bem andou pela Rua da Cachaça...

As ruas do centro histórico de São João del-Rei são tão antigas que muitas delas são citadas em documentos datados das primeiras décadas do século XVIII. Salvo poucas exceções, mantiveram seu traçado original, o que permite compreender como era o centro urbano são-joanense logo que o Arraial Novo de Nossa Senhora do Pilar do Rio das Mortes tornou-se Vila de São João del-Rei. O Largo do Rosário, por exemplo, atual Praça Embaixador Gastão da Cunha, surgiu antes mesmo de 1719, pois naquele ano foi benta a Igreja de Nossa Senhora do Rosário, nele situada e que originalmente lhe deu nome. Também neste ano já existia o Largo da Câmara, hoje, Praça Francisco Neves, conforme registro da compra de imóveis naquele local, para abrigar a sede da Câmara de São João del-Rei. A Rua Resende Costa, que liga o Largo do Carmo ao Largo da Cruz, antigamente chamava-se Rua São Miguel e, em 1727, tinha lojas legalizadas, funcionando com autorização fornecida pelo Senado da Câmara daquela Vila colonial.  Por

Padre José Maria Xavier, nascido em São João del-Rei, tinha na testa a estrela da música barroca oitocentista

 Certamente, há quase duzentos anos , ninguém ouviu quando um coro de anjos cantou sobre São João del-Rei. Anunciava que, no dia 23 de agosto de 1819, numa esquina da Rua Santo Antônio, nasceria uma criança mulata, trazendo nas linhas das mãos um destino brilhante: ser um dos grandes - senão o maior - músico colonial mineiro do século XIX . Pouco mais de um mês de nascido, no dia 27 de setembro, (consagrado a São Cosme e São Damião) em cerimônia na Matriz do Pilar, o infante foi batizado com o nome  José Maria Xavier . Ainda na infância, o menino mostrou gosto e vocação para música. Primeiro nos estudos de solfejo, com seu tio, Francisco de Paula Miranda, e, em seguida dominando o violino e o clarinete. Da infância para a adolescência, da música para o estudo das linguas, José Maria aprendeu Latim e Francês, complementando os estudos com História, Geografia e Filosofia. Tão consistente era seu conhecimento que necessitou de apenas um ano para cursar Teologia em Mariana . Assim, j