São João del-Rei não é só uma paisagem urbana. Muito mais do que isso, São João del-Rei é uma paisagem humana. Os largos, os becos, as praças, as ruas tem vida, pulsam esperança, respiram gentileza, transpiram sonho, sonham saudades. São João del-Rei é são-joanense.
Cidade e gente são uma coisa só, indissociáveis. Tanto que, mais do que em outros lugares, São João possui personagens emblemáticos, sem os quais não se consegue imaginar determinados territórios. O tempo passa, as vidas vão, mas os personagens permanecem na memória de quem os conheceu, impregnados na paisagem da qual faziam parte. Que bom que é assim, pois a memória eterniza.
Alguém consegue imaginar o beco atrás da igreja do Rosário sem o Murilo, da bicicletaria? Difícil, não é? Pois é...
Em fins do ano passado, bicicletaria fechada, ele andou sumido e fez muita falta. A saúde lhe requisitava cuidados, mas seu lugar estava guardado naquele cantinho antigo, amigo e poético. Seu lugar estava guardado nas procissões, que ele tanto gostava de ver. Seu lugar estava guardado no coração dos amigos e de todos que passavam naquela viela e recebiam dele alguma cordialidade. Bom dia. Cuidado que vem chuva. Já foi tomar vacina? O frio não tá pra brincadeira. Amanhã vai ser melhor. A gente vai levando. enquanto pode e Deus deixa...
Foi uma alegria quando Murilo voltou. Parece que até o desbotado da parede do casarão da esquina, que dava o porão para a bicicletaria, recuperou a cor, ficou mais azul. O céu ficou mais azul, feliz para combinar com a camisa azul de nosso amigo.
Neste domingo, às 3 da tarde, ouvi o sino de São Gonçalo tocar triste. Sabia que era alguém dando adeus, mas não pensei que fosse nosso amigo se despedindo. Se despedindo não, só avisando que ele vai continuar lá, atrás da igreja do Rosário, sorrindo generoso para nós e semeando as mesmas gentilezas. A gente não vai ver, mas vai sentir que ali bem perto está alguém que honrou a vida e continua vivo, para sempre, na eternidade.
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Texto e foto: Antonio Emilio da Costa
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