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Dia 20 de novembro não passa em branco em São João del Rei!

 


O passado e o presente estão tão unidos, e até mesmo tão emaranhados, em São João del-Rei, que não é raro, de repente, a gente se confundir e, por alguns instantes, ficar em dúvida quanto ao tempo em que agora se está. Se no século 18, 19, 20 ou 21. Principalmente se num domingo à noite, na cidade sonolenta, você começar a ouvir, ao longe, o toque de atabaques, o bater de palmas, o som de vozes firmes, entoando cantos ritmados e desconhecidos, quase ancestrais. Uma situação incomum no coração do centro histórico de São João del-Rei, mais precisamente no Largo do Rosário. 

Um local que, segundo a História, desde os idos de 1708, foi um território de muito significado, força e importância para os africanos e seus descendentes, num tempo em que estas terras ainda eram o Arraial Novo de Nossa Senhora do Pilar do Rio das Mortes. Mais de 300 anos depois o Largo do Rosário ainda conserva para os descendentes são-joanenses dos africanos o mesmo significado e a mesma força, pois foi lá que, em 2022, os grupos de jongo Negra Mina, de São João del-Rei, e Preta Bandeira, do interior de São Paulo, fizeram uma grande roda de jongo, para comemorar o Dia da Consciência Negra.

Reunindo efetivamente mais de 50 pessoas, a maioria do bairro São Dimas, foi uma manifestação político-cultural alegre, livre e espontânea, como são o próprio jongo e a arte afro-brasileira em toda sua extensão e pluralidade. O aspecto político, de sentido infinitamente mais amplo do que o partidarismo, estava presente na intenção e na finalidade de dar visibilidade ao povo preto são-joanense, resgatar para ele, simbolicamente, um território emblemático, e evidenciar a presença e a participação ativa dos africanos e de seus descendentes de ontem e de hoje em todo o processo de formação, evolução e desenvolvimento de São João del-Rei. E mais: por meio da cultura viva e tradicional afro-brasileira, no caso o jongo, reivindicar reconhecimento, respeito e igualdade de direitos e oportunidades, como estava sintetizado em uma faixa, com a expressão "Democracia sem racismo".

Para mostrar que o jongo é alegria, integração e festa, a cada cantiga uma dupla se revezava no centro da roda, dançando uma ginga que se perpetuou através dos tempos. E para mostrar que festa também é mobilização e conscientização, de tempos em tempos eram lembrados o sentido e a importância de se celebrar politicamente o Dia Nacional da Consciência Negra, mencionando nomes de pessoas que se destacaram e se destacam no movimento contra o racismo e pela igualdade, contra todas as formas de desvalorização, discriminação, segregação, expropriação e apropriação, violências e o genocídio do povo preto, sobretudo o extermínio de jovens.

Quer saber um pouquinho sobre jongo? Então dá uma olhada neste vídeo 

https://www.youtube.com/watch?v=AgrbjtOjvcE

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Texto e foto: Antonio Emilio da Costa

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