São dezenas, os Cruzeiros da Penitência, ou da Paixão, espalhados pelo centro histórico de São João del-Rei e adjacências. Altos, de madeira, e com elementos que lembram a paixão de Cristo, eles são mais do que meros elementos típicos da arquitetura local. Tambem são mais do que marcos religiosos, pois têm significados, funções e finalidades que perpassam o senso coletivo e chegam ao âmago do universo subjetivo, com suas memórias, crenças, necessidades e tudo o que constitui a visão de mundo individual.
Para muitos são-joanenses, os cruzeiros são marcos de fé. Existem para lembrar o sofrimento e a morte de Jesus Cristo, conclamando cotidianamente quem os vê a zelarem por uma vida correta, piedosa e abnegada, a exemplo do que foi a vida de Cristo.
Para outros, eles têm poder. Tanto que se benzem fazendo o nome do pai, sempre que passam diante dele, pedindo proteção, não raro várias vezes por dia. Mais do que um símbolo, certamente estes imaginam nos cruzeiros algo da presença divina daquilo que ele representa e por isso repetem diante dele o gestual devoto, como um diálogo ou uma saudação.
Nesta perspectiva, como algo vivo e sagrado, percebem no cruzeiro um canal de comunicação mediada e por isso lhe entregam para a melhor destinação, deixando em seu corpo ou em sua base, terços inteiros ou arrebentados, imagens quebradas e outros objetos de cunho religioso. Deste modo desfazem-se do que não mais serve ou do que não mais querem, sem a culpa nem o medo de desprezar.
Apesar de ser uma cruz modesta fincada sobre uma pedra, em uma encruzilhada torta, que pode ser considerada cruzeiro unicamente por ter ao alto a placa com as iniciais JNRJ, a cruz situada no início da Rua Padre Faustino é uma das que mais serve a este propósito. Tanto que, em seu corpo, há vários terços pendurados. Volta e meia vê-se um novo, no lugar de outro que desaparece, talvez espontaneamente, ninguém sabe.
Há pouco tempo, em uma manhã de sábado, um buquê de margaridinhas brancas foi colocado anonimamente no pé daquele cruzeiro. Quem o colocou, certamente o trouxe do Mercado Municipal, pois as flores estavam enroladas em um pedaço de jornal, amarrado com fita de plástico reciclado, exatamente do mesmo modo que se compra na banca de flores.
Pelo modo como o buquê de margaridas foi deixado entre as outras flores de plástico, tudo indica ter sido um ato furtivo e apressado. Por que? Quem sabe?... Pagamento de promessa, pedido de graça, agradecimento? Quem vai saber?...
O que se sabe é que, mais do que monumentos estáticos, os cruzeiros continuam fazendo parte da vida de muitos são-joanenses...
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Texto e foto: Antonio Emilio da Costa
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